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O racismo contemporâneo

O racismo contemporâneo

As manifestações contra o racismo, de vez em quando promovidas em países da Europa, prestam-se para exorcizar os seus próprios demônios. Historicamente a se considerar branca, a Europa é hoje um continente em crescente miscigenação. Os fluxos migratórios vindos da África, do Oriente Médio e dos países asiáticos contribuem para uma diversidade humana nem sempre bem aceita pelas classes médias. E são usados pelos partidos da direita e extrema-direita para irrigar o racismo latente que nunca abandonou o velho continente e assim se beneficiarem em sua sistemática campanha que tem por objetivo o domínio dos aparelhos de Estado.

Foi na primeira metade do século XX, com o sucesso que obteve o nazifascismo, que o racismo europeu conheceu o seu auge como sintoma de uma grave doença social. Não só na Alemanha de Hitler e na Itália de Mussolini. Quase todos os países abrigaram em seus sistemas políticos partidos extremistas de direita fanáticos da supremacia ariana. O momento dramático que a Europa viveu com o flagelo das guerras mundiais não foi suficiente para uma completa revisão dessa trágica experiência dos preconceitos raciais em sua História. Não só o nazismo e o fascismo como também o seu forte conteúdo racista continua a ser contemporâneo.

As redes sociais são hoje o veículo adequado para a disseminação de teses racistas e preconceitos de toda ordem. Não existem limites para as notícias falsas, as teses fantasiosas e a mentira pura. Há presença crescente de sites e posts a exibir a suástica nazista pregando a supremacia branca, mais explícita do que as mensagens codificadas em copos de leite com que Bolsonaro e alguns membros do seu nefasto governo saudaram em suas lives os iniciados dessa ideologia repugnante.

Intolerância

 Publicado recentemente, o relatório anual da Comissão Europeia Contra o Racismo e a Intolerância (ECRI) do Conselho da Europa registrou que o racismo, a discriminação racial e a intolerância estão em ascensão. Diz que “o discurso de ódio on-line, que seria inaceitável no passado, é agora uma ocorrência quotidiana” e que “o debate democrático está a ser minado por opiniões polarizadas”.

O documento da ECRI acrescenta que o ódio contra muçulmanos e judeus está a ganhar espaço, os membros das comunidades negras da Europa ainda enfrentam preconceitos e discriminação de longa data e as estratégias para os ciganos frequentemente fracassam perante a pobreza e a marginalização, sendo isso ainda pior para as mulheres.

Privilégios

O racismo institucionalizado oferece todos os privilégios à população branca, que tem prioridade na saúde, educação e emprego. A European Network Against Racism (ENAR), uma rede pan-europeia de advocacia pela igualdade racial, acusa os países da União Europeia de racismo e preconceito. Os mais altos níveis de desemprego são entre os grupos de origem africana. Eles têm um índice maior de desemprego na Finlândia. Na Suíça, país de tradicional neutralidade nos históricos conflitos do continente, as empresas exigem dos candidatos a emprego uma fotografia como parte do currículo enviado. Fazem assim a triagem em favor de candidatos brancos. Uma pesquisa revelou na Lituânia que uma em cada cinco pessoas se recusa a trabalhar em companhia de um negro e na Suécia uma entre quatro pessoas negras com curso superior ocupa um emprego de baixa qualificação. Na Holanda, estudantes negros receberam notas baixas dos professores embora tenham apresentado altas notas num exame de avaliação de âmbito nacional.

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O programa Panorama, da BBC, apresentou uma lista dos países mais racistas da Europa. São eles, não necessariamente pela ordem de intensidade do preconceito: Suécia, Grã-Bretanha, Áustria, Suíça, Alemanha e a Polônia, esta última apontada como a mais racista dentre todos.

Expansão do racismo

A existência de representação dos partidos de extrema direita em dois terços dos parlamentos em países europeus, bem como o crescimento desses partidos, é motivo de preocupação na ONU. O ex-Alto-Comissário para os Direitos Humanos, o jordaniano Zeid Ra’ad Al-Hussein, se disse alarmado com o crescimento dos pronunciamentos daqueles partidos e do seu discurso racista e xenófobo.

“Este discurso baseado no racismo, xenofobia e incitamento ao ódio expandiu-se de modo tão significativo que em vários países domina a cena política”, disse Al-Hussein num relatório à Assembleia Geral das Nações Unidas, referindo-se a países europeus. E deu como exemplo a Hungria, Polônia, Áustria e República Checa. Citou o primeiro-ministro húngaro, Viktor Orbán. A ele se referiu como um dos políticos “xenófobos e racistas […] destituídos de qualquer sentimento de vergonha” por ter dito “que não quer que a sua cor [de pele] se misture com outras”.

Não existe nenhuma base científica, política ou moral que fundamente qualquer tese racista. A pseudofilosofia nazista chegou a elaborar na Alemanha teorias de racismo científico que classificavam como raças inferiores judeus, ciganos, negros e eslavos. Foi uma tentativa de justificar a existência de uma raça superior, a raça nórdica, à qual pertenceriam os alemães, em oposição às raças inferiores. Estas, consideradas Lebensunwertes Leben (“vida indigna de viver”).

 O resultado foi o Holocausto e os maiores crimes que a Humanidade foi forçada a testemunhar nos últimos séculos.

Este trágico episódio da recente história da Europa e do mundo foi que inspirou a Convenção Internacional sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação Racial (ICERD, do inglês International Convention on the Elimination of All Forms of Racial Discrimination).  É um dos principais tratados internacionais em matéria de Direitos Humanos. Sua ata de fundação diz que todas as pessoas nascem livres e iguais em dignidade e direitos, sem distinção de qualquer espécie e principalmente de raça, cor ou origem nacional. Acrescenta que qualquer doutrina de superioridade baseada em diferenças raciais é cientificamente falsa, moralmente condenável, socialmente injusta e também perigosa.

*Imagem em destaque: grupo de mulheres negras em Paris (William Hamon/Flickr)

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